Duas profissionais e uma aluna da EEP traçam o perfil da engenharia da década de 1980 aos dias atuais e mostram que o preconceito perde espaço para o posicionamento da mulher
Para mostrar que o ser humano, e sobretudo a mulher, pode fazer suas próprias escolhas e correr atrás de seus sonhos independente de obstáculos e preconceitos, a EEP- Escola de Engenharia de Piracicaba aproveita o Dia Internacional da Mulher, 8 de março, para compartilhar a história de duas engenheiras e uma estudante de engenharia que, em épocas diferentes, souberam se posicionar e conquistar seus próprios espaços.
Uma delas é a engenheira civil Rosângela Rizzollo Camolese, 60 anos, formada pela EEP no início da década de 1980. Ela conta que à época, existiam poucas mulheres cursando engenharia não apenas em Piracicaba, mas no Brasil. “Mais de 80 alunos se formaram comigo, sendo apenas 14 mulheres, pois muitas desistiam logo no começo por conta de uma certa pressão que a sociedade impunha à engenheira mulher”, conta.
Ela se recorda inclusive de algumas brincadeiras que irritavam as alunas. “Era comum nos perguntarem o que estávamos fazendo na engenharia, já que lugar de mulher era na cozinha”, lembra.
Segundo a engenheira, os comentários também ocorriam em época de provas de estradas e pontes, quando todos os alunos iam vistoriar obras e precisavam, literalmente, colocar o pé na lama. “Alguns colegas perguntavam se não seria mais agradável ser apenas engenheira projetista e permanecer no escritório a exercer a engenharia de campo”, disse.
Rosângela revela, entretanto, que com o tempo, esse sentimento foi se arrefecendo, pois à medida que as alunas se envolviam com os colegas em sala, eles percebiam que as mulheres eram importantes em suas vidas acadêmicas. “Éramos parceiras, companheiras de luta nos estudos e nas reivindicações para melhorias do campus e da estrutura física do local, por meio do diretório acadêmico do qual fazíamos parte”, ressalta.
Para ela, apesar de ainda haver muito o que se fazer contra a discriminação de gêneros no Brasil, atualmente as mulheres já são vistas como profissionais atuantes não só na sociedade como prestadoras de serviços e profissionais de ponta, mas também em seus lares, onde cumprem importante jornada de trabalho.
“Felizmente, e graças à maior conscientização da sociedade como um todo, o extremismo já passou e hoje o preconceito está bem minimizado”.
Pouco preconceito
Aos 30 anos, a engenheira Bruna Juliane de Lima Miliatti se considera feliz e realizada com a profissão. Ela se formou engenheira civil pela EEP em 2014 depois de cursar o técnico em edificações e hoje é proprietária de seu próprio negócio, a Eleve, escritório de engenharia e arquitetura, em Limeira.
Antes, porém, ela foi funcionária de uma empresa que lhe permitiu trabalhar em Recife, onde tocou obra junto a uma equipe composta por cerca de 40 homens. “Sou apaixonada pelo que faço e, apesar de observar um movimento diferente na engenharia, minha turma de faculdade tinha poucas mulheres”, observa.
Bruna conta que, em seu escritório, ela e sua equipe fazem toda a parte de projetos e obras e também administra a atuação de pedreiros, ajudantes e carpinteiros. Segundo ela, a decisão de ser dona do próprio negócio ajudou-a a se posicionar de forma firme perante à equipe. “Talvez por estar no controle da empresa, o respeito é maior; pois percebo que quando se trata da mulher estagiária por exemplo, o comportamento dos homens tende a ser mais informal”, revela.
Mesmo assim, Bruna conta que nunca enfrentou nenhum problema ou preconceito por ser mulher. “Percebo que muitas profissionais precisam trabalhar a questão do posicionamento, pois a maneira de falar e de se vestir, por exemplo, influencia a forma como a equipe te enxerga; pois às vezes, a dificuldade parte da própria mulher e do medo que ela tem. Não é preciso deixar de ser simpática e sorridente, mas é preciso ter coragem, conhecimento, habilidade técnica e falar com firmeza”, disse.
Segundo a engenheira, a maior felicidade proporcionada pela profissão é poder entrar na intimidade da pessoa, entender como é a família, suas necessidades e recursos para poder literalmente ajudar na construção de um sonho e ainda a manter outras famílias através da empregabilidade.
Ela conta que, quando fez EEP, há oito anos, a sala tinha mais homens mas já se via um aumento no número de mulheres. “Meu esposo Bruno também é engenheiro formado pela EEP e até hoje nós mantemos boas relações de amizade com nossos colegas de sala”, conta.
Quase nenhum preconceito
Aos 22 anos de idade, a aluna Aline Oliveira Zatarin está cursando o 7º semestre de Engenharia de Produção da EEP por incentivo da família e pela realização do sonho de se tornar uma engenheira.
“Acredito que, como eu, todo calouro comece o curso cheio de expectativas e ansiedade para conhecer a faculdade, os colegas e os professores; e foi exatamente assim que me senti quando ingressei na EEP, até mesmo porque essa é uma fase de muitas mudanças na vida dos jovens; é basicamente o momento que cada um sai da adolescência e parte para a vida adulta”, considerou
Ela conta que a ansiedade ficava cada vez mais pulsante pelo fato de ser mulher no mundo da engenharia. “Mesmo que a mulher esteja mostrando sua força ao mundo, como pessoa e como profissional, ainda há alguns tabus de que a mulher não pode fazer algumas coisas em profissões consideradas mais masculinizadas, como a engenharia”, afirmou.
Aline revela que conhece muitas mulheres que ainda encontram barreiras de desigualdade como dificuldade para ocupar alguns cargos nas industrias, diferença salarial e falta de oportunidade. “Aos poucos estamos transformando esse cenário e me surpreendeu muito quando eu de fato comecei a faculdade, porque a minha turma é muito equilibrada com relação ao gênero e isso me fez notar que as mulheres querem conquistar seu espaço e descontruir este estereótipo”, afirmou.
Ela conta que a EEP e seu corpo docente sempre foram muito receptivos, fazendo com que os alunos se sintam em casa. “Isso é fundamental para que cada uma de nós, mulheres, nos sintamos mais à vontade durante as aulas em sala e nos laboratórios”, observa.
Aliás, segundo ela, outro grande diferencial em sua vida acadêmica foi o envolvimento em diversas outras atividades. “Particularmente, nunca fiquei presa às atividades em sala e, na EEP, eu ingressei na equipe EEP Baja – projeto que desafia os estudantes de engenharia a desenvolver um veículo off-road em busca de um melhor resultado em projetos, construções, testes e índole de resistência”, revela Aline, a única mulher no grupo de 16 integrantes.
Ela também foi indicada para compor o Nupeep- Núcleo Paulista de Estudantes de Engenharia de Produção integrado à Abrapo Jovem- Associação Brasileira de Engenharia de Produção. “Dos nove integrantes do Nupeep, quatro são mulheres”, disse Aline reverenciando a experiência. “A mulher precisa ter mais consciência de sua força, garra e importância na sociedade”, completou.
Comments