Tímido, de fala mansa e sorriso cativante. Esse é o perfil do jovem africano Ciuna Crufe, 25, que deixou a Guiné-Bissau em 2022, seu país de origem, em busca de um futuro melhor. No Brasil ele trabalhou como servente de pedreiro, numa fábrica de vassouras e rodos e até tentou seguir a carreira de jogador de futebol profissional. Neste período passou por grandes necessidades financeiras. A sua trajetória começou a mudar quando ingressou em novembro do mesmo ano na Fundação Municipal de Ensino de Piracicaba (Fumep), onde conseguiu uma bolsa de estudos para o curso de Administração na Escola de Engenharia de Piracicaba (EEP) e um estágio remunerado no Centro de Educação Profissional de Piracicaba (CEPP). Por isso ele considera a Fumep como um porto seguro, um lugar de proteção. Seu principal sonho é concluir os estudos em 2026, conseguir emprego numa grande empresa e assim ter condições para trazer ao Brasil a sua mãe, Maria Té, além dos três irmãos menores, Daniel, Joia e Samuela.
Ciuna conta que desde pequeno sonhava em se mudar para o Brasil, motivado pelos programas de auditório dos apresentadores Gugu Liberato e Rodrigo Faro, que eram retransmitidos para os países africanos. A dura realidade da Guiné-Bissau, um dos países mais pobres do mundo, marcado pela fragilidade política e institucional desde a sua independência de Portugal em 1974, também o motivou a deixar a nação. “A inflação na Guiné-Bissau é altíssima e por lá não existem muitas oportunidades de serviço. As mulheres trabalham no campo e os homens na construção civil”, comentou.
Depois de morar inicialmente em Porto Feliz e Itu, Ciuna decidiu tentar a sorte em Piracicaba, reconhecida pelas inúmeras instituições de ensino e pesquisa. Ao chegar na Fumep, que já havia sido referendada por amigos e familiares que moravam no Brasil, ele optou pelo curso de Administração. “No meu íntimo eu sabia que só teria condições de ajudar a minha família se progredisse nos estudos. Optei pelo curso de Administração porque ele nos dá um bom suporte para ingressar em qualquer empresa, independente do segmento de atuação”, revelou.
Dificuldades – antes de conseguir um estágio remunerado o jovem passou por vários momentos de necessidade, que só não foram piores graças à ajuda de algumas pessoas da Fumep, que sempre lhe enviavam cestas básicas nos momentos mais oportunos. “Uma destas cestas chegou quando eu e meu pai, ambos desempregados, não tínhamos nada para comer em casa e estávamos com o pagamento do aluguel atrasado. Neste dia eu até chorei de alegria”, disse.
Ciuna também se recorda que durante o inverno de 2023 foi para a Fumep sem blusa no período da manhã e, ao entardecer, a temperatura despencou de tal forma que ele não conseguia mais prestar atenção na aula. “Todos se sensibilizaram com a minha situação. Um colega de classe tirou a sua blusa e me deu. Um professor também me arrumou outro agasalho. Eu sei que no final daquela noite eu recebi seis blusas e algumas delas até hoje não sei de onde surgiram. Esse gesto de solidariedade marcou a minha vida para sempre, ” sentenciou.
Determinação – Disciplinado, o jovem africano passa o dia no campus da Fumep, no período da manhã e tarde estagiando na secretaria do CEPP e no período noturno cursando o 3º semestre de Administração na EEP. Entre uma atividade e outra ele vai até a biblioteca para aprofundar os estudos das disciplinas vistas em sala de aula, além de estudar gramática para melhorar o seu desempenho na língua portuguesa. Como gasta o seu salário quase que na totalidade com o pagamento da faculdade e transporte diário, Ciuna costuma ficar atento aos cursos gratuitos oferecidos em Piracicaba. Nos últimos meses conclui os cursos de Excel Básico, nas ferramentas do Power BI e no serviço de Armazenamento de Dados nas Nuvens. “Não posso desperdiçar nenhuma oportunidade de crescimento. Se quero trazer a minha família para o Brasil preciso me dedicar aos estudos”, frisou o estudante.
Reconhecimento – O professor Alberto Martins Júnior, coordenador do curso de Administração da EEP disse que Ciuna é um exemplo de dedicação. Um aluno extremamente esforçado que tem a sua postura elogiada por todos os professores. “É natural que ele tenha algumas dificuldades em virtude da língua e por vir de um país que possui outro sistema de ensino, mas independente disso, ele tenta sempre se manter no mesmo nível dos demais”, confirmou Júnior.
“O estagiário Ciuna Crufe, desde que ingressou na secretaria do CEPP/Pós-Graduação, demonstrou bastante força de vontade em querer ajudar e sempre aprender e isso a gente enxerga como um ponto positivo na sua vida profissional. Além disso, ele exerce bem as atividades de rotina, sendo extremamente gentil no atendimento ao público”, pontuou o professor Felipe Roger Victor, gerente administrativo do CEPP.
Publicação
Comments